quinta-feira, dezembro 29, 2005

Avaliação - Alunos - Parte II


Para compreender a questão da avaliação é necessário compreender como funciona no dia a dia o processo de ensino e aprendizagem. Vou tornar a coisa o mais simples possível e centrar a minha exposição no ensino básico por se tratar do ensino obrigatório, mais propriamente no 3º ciclo, o último.

É aqui que o sistema educativo português começa a revelar a sua esquizofrenia na medida em que o que é solicitado aos professores a nível pedagógico na relação a construir com os seus alunos não é de todo compatível com modelos de avaliação nacionais tipificados e normalizados em versões de exame.

Não é sério pedir aos professores que implementem uma determinada filosofia de ensino centrada em metodologias mais construtivistas e menos centradas nas matérias e usar exames nacionais, normalizados para avaliar o desempenho dos alunos. Não é sério para com os alunos e muito menos para com trabalho desenvolvido pelos professores.

Aqui o ministério (não necessariamente esta ministra) descobriu que podia fazer exames nacionais sem comprometer o futuro dos alunos. Assim temos ao longo do ensino básico várias provas cujo peso não compromete o percurso do aluno mas os seus resultados têm permitido avaliar (julgar) o sistema de ensino. Ou seja supõe-se avaliar o que os alunos aprenderam, de acordo com uma matriz nacional que se tem vindo a diluir com a autonomia das escolas.

Quem não se lembra das orientações para os exames de nono ano onde era suposto o exame abordar sobretudo conteúdos do nono ano? Depois foi descobrir que afinal lá estava todo o programa do 3º Ciclo. Havia claro está uma razão para isto: a autonomia das escolas permite que os conteúdos possam ser geridos de forma diferente assim um determinado conteúdo apresentado aos alunos no 8º ano pode noutra escola aparecer no 9º ano.

Existe aqui no entanto um aspecto caricato. Todas as escolas foram de uma forma mais ou menos tácita obrigadas a gerir os conteúdos da mesma maneira devido ao facto de as editoras dos manuais escolares (todas) terem à medida que a reforma entrava em vigor ano após ano apresentado o manual para esse mesmo ano. Assim quando o 7º ano entrou na reforma os manuais apresentados pelas editoras versavam todos a mesma matéria não se verificando uma proposta completa para o 3º ciclo.

Relativamente às referidas provas e comportamento dos alunos perante as mesmas verifica-se um manifesto desinteresse. Claro está os alunos não nasceram ontem e num mar de permissividade e de falta de rigor quem os consegue motivar para um desempenho à altura das suas capacidades quando o resultado dificilmente interferirá com as classificações já obtidas.

A perversidade vai mais longe e arrisco-me mesmo a dizer que andamos, nós os professores a dormir quando não protestamos com coisas destas e passo a explicar.

Sou professor de Física e Química e o ano passado a alguns alunos já “chumbados” foi-lhes facultado de acordo com a lei a realizar exames nacionais. Assim estes alunos tiveram um exame nacional a todas as disciplinas e uma prova oral. Para além de ter de corrigir a prova escrita tive de realizar e avaliar a prestação oral destes alunos que todos sabemos dificilmente obteriam a aprovação. Afinal tinham acabado de ser avaliados à coisa de uma ou duas semanas. O que teria mudado entretanto que justificasse nova avaliação? Claro está que nada se alterou nem a avaliação tendo obtido quer na prova oral quer na escrita classificações reduzidíssimas. Para meu espanto a estória não terminou aqui e somos todos os professores responsáveis pelas provas realizadas convocados para uma reunião que deveria avaliar as diferentes situações e ponderar a passagem ou não dos referidos alunos. Para maior espanto meu era possível tendo em conta o registo biográfico dos alunos entre outros factores justificar a passagem destes alunos apesar de terem obtido classificações negativas. Andam a gozar com o trabalho dos professores, não acham?

Tudo isto é mais grave quando no final do ano somos obrigados a realizar uma prova global, respectiva matriz com critérios de correcção e mais duas provas idênticas. Claro está nada demais. Mas o peso destas provas é ridículo e mais uma vez os alunos descuram o trabalho não se empenhando para as mesmas e o que é mais grave assinam e fazem umas coisitas para não terem nível um, a única classificação que os poderia comprometer.

O professor para além de ter de preparar as provas e as corrigir tem de aceitar isto como um comportamento normal? No fim vêm os treinadores de bancada dizer que os professores isto e aquilo…

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